domingo, novembro 25, 2012

Angústia é doença e tem cura por Adriana Toledo


«Chego pela manhã ao complexo do Hospital das Clínicas, em São Paulo, e me dirijo ao primeiro andar do prédio do Instituto de Psiquiatria, onde sou recebida pelo chefe do departamento, o psiquiatra Valentim Gentil. Nosso objetivo é definido: caracterizar, com elementos concretos, o conceito de angústia. A missão é árdua. "Diferentemente do medo ou da ansiedade, que são experimentados pela maioria das pessoas, a angústia acomete menos de 50% da população. E nunca tive essa experiência, o que dificulta a tarefa de descrevê-la com precisão", confessa. "Em geral, meus pacientes relatam uma agonia mental sem gatilho aparente, atrelada a um sufoco semelhante ao da asma, e uma dor ou compressão no peito", descreve.

Incentivar o diagnóstico e um tratamento personalizado é a proposta de Gentil, que assina o artigo intitulado Why Anguish? — em português, Por que angústia? —, que acaba de ser divulgado na publicação científica inglesa Journal of Psychopharmacology. Isso porque, nas discussões entre especialistas do mundo todo, o sentido dessa emoção se esvaziou ao longo do tempo. E frequentemente ela é confundida com o distúrbio de ansiedade ou de pânico (veja os complementos desta matéria).

"Mas são comportamentos mentais diferentes, com padrões de ativação cerebral distintos", defende Gentil. "A ansiedade é uma apreensão exagerada em relação ao futuro, enquanto a angústia é um sofrimento relacionado ao presente."

Munida dos esclarecimentos sobre as manifestações físicas do sintoma, sigo ao consultório da psicanalista paulistana Maria de Lourdes Félix, que auxilia Gentil nas pesquisas sobre a face psicológica da angústia. "Meus pacientes costumam levar as mãos ao peito e reportar um sentimento de vazio. Sentem conflitos diante das inúmeras possibilidades de escolhas no dia a dia e questionam o sentido de sua existência", conta. "Em casos extremos, essas pessoas são dominadas pela introversão. Elas perdem a capacidade de análise, de lidar com o cotidiano, de interagir socialmente. Ficam paralisadas."

À luz do filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard (1813-1855), a psicóloga Marília Dantas, da Universidade Estácio de Sá, em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, traduz o mal-estar: "O ser humano sente desamparo, incerteza, falta de controle diante da liberdade de decidir. Optar por um caminho significa correr riscos, abrir mão das alternativas. Isso é angustiante".

Reconhecer um quadro de angústia é uma função que cabe a especialistas. Mas os angustiados de plantão podem contribuir, fornecendo detalhes de como se sentem. É o que constatei nas conversas durante os trajetos de consultório em consultório. A pergunta que fiz a motoristas, recepcionistas, colegas e pedestres com quem cruzei no caminho era sempre a mesma: o que é angústia para você? As respostas variaram. "É pensar como seria minha vida se eu tivesse estudado psicologia." Ou "É um beco sem saída dentro do peito". Ou ainda "É uma incerteza sobre as consequências das decisões que tomei".

Infelizmente, a maioria dos angustiados só procura ajuda especializada quando a sensação ruim beira o insuportável. "Eles chegam ao pronto-socorro com dor e opressão no tórax, peso e desconforto no peito", confirma o cardiologista César Jardim, supervisor do pronto-socorro do Hospital do Coração, em São Paulo. Os sintomas se assemelham aos de problemas cardiológicos, como infarto. "Mas os problemas cardiovasculares só se confirmam em 30% dos casos", estima. Ele conta que, depois de realizar exames e apontar que o sujeito está em condições perfeitas de saúde, os pacientes confessam que vêm se sentindo nervosos e... angustiados.

Quando é assim, excluída a presença de doenças físicas, o passo seguinte deveria ser a visita a um psiquiatra. "Há hipóteses de que a angústia seja desencadeada por uma maior ativação de uma região chamada ínsula, no córtex cerebral, relacionada à percepção de funções viscerais, como as do coração, do diafragma e dos pulmões", explica Valentim Gentil. "Por isso, acreditamos que suas vítimas possam responder bem a calmantes chamados benzodiazepínicos, a alguns antipsicóticos e a uma classe de antidepressivos conhecida como tricíclicos", continua. "A imipramina é um dos principais medicamentos desse grupo e se mostra eficaz, apesar de promover eventuais efeitos colaterais, como tonturas e alterações cardíacas", completa seu colega Jair Mari, da Universidade Federal de São Paulo. Essa droga modula neurotransmissores como a noradrenalina, substâncias que agem no cérebro e controlam as emoções.

O ideal é complementar esse tratamento com o de um psicólogo ou psicanalista. "Trabalhamos o desenvolvimento emocional, fazendo com que o paciente reflita e traduza seus pensamentos, criando condições para contornar sentimentos que julga insuportáveis", explica Maria de Lourdes. A angústia é, portanto, um problema de saúde e necessita de acompanhamento. Se ela anda sufocando-o, chega de sofrer em silêncio: busque auxílio e afrouxe, de vez, esse nó dentro do peito.»

http://saude.abril.com.br/edicoes/0324/bem_estar/conteudo_563179.shtml?fb_action_ids=424343320966555&fb_action_types=og.recommends&fb_source=aggregation&fb_aggregation_id=246965925417366

sexta-feira, outubro 05, 2012

Boss AC - "Alguém me ouviu (Mantém-te Firme)" featuring Mariza

«Não me resta nada, sinto não ter forças para lutar
É como morrer de sede no meio do mar e afogar
Sinto-me isolado com tanta gente à minha volta
Vocês não ouvem o grito da minha revolta
Choro a rir, isto é mais forte do que pensei
Por dentro sou um mendigo que aparenta ser um rei
Não sei do que fujo, a esperança pouca me resta
É triste ser tão novo e já achar que a vida não presta
As pernas tremem, o tempo passa, sinto cansaço
O vento sopra, ao espelho vejo o fracasso
O dia amanhece, algo me diz para ter cuidado
Vagueio sem destino nem sei se estou acordado
O sorriso escasseia, hoje a tristeza é rainha
Não sei a alma existe mas sei que alguém feriu a minha
Às vezes penso se algum dia serei feliz
Enquanto oiço uma voz dentro de mim que diz..

Chorei
Mas não sei se alguém me ouviu
E não sei se quem me viu
Sabe a dor que em mim carrego e a angústia que se esconde
Vou ser forte e vou-me erguer
E ter coragem de querer
Não ceder, nem desistir eu prometo

Busquei
Nas palavras o conforto
Dancei no silêncio morto
E o escuro revelou que em mim a Luz se esconde
Vou ser forte e vou-me erguer
E ter coragem de querer
Não ceder, nem desistir eu prometo

Não há dia que não pergunte a Deus porque nasci
Eu não pedi, alguém me diga o que faço aqui
Se dependesse de mim teria ficado onde estava
Onde não pensava, não existia e não chorava
Sou prisioneiro de mim próprio, o meu pior inimigo
Às vezes penso que passo tempo de mais comigo
Olho para os lados, não vejo ninguém para me ajudar
Um ombro para me apoiar, um sorriso para me animar
Quem sou eu? Para onde vou? Donde vim?
Alguém me diga porque me sinto assim
Sinto que a culpa é minha mas não sei bem porquê
Sinto lágrimas nos meus olhos mas ninguém as vê
Estou farto de mim, farto daquilo que sou, farto daquilo que penso
Mostrem-me a saída deste abismo imenso
Pergunto-me se algum dia serei feliz
Enquanto oiço uma voz dentro de mim que me diz...

Tento não me ir abaixo mas não sou de ferro
Quando penso que tudo vai passar parece que mais me enterro
Sinto uma nuvem cinzenta que me acompanha onde estiver
E penso para mim mesmo será que Deus me quer
Será a vida apenas uma corrida para a morte?
Cada um com a sua sina, cada um com a sua sorte
Não peço muito, não peço mais do que tenho direito
Olho para trás e analiso tudo o que tenho feito
E mesmo quando errei foi a tentar fazer bem
Não sei o que é o ódio não desejo mal a ninguém
Há-de surgir um raio de luz no meio da porcaria
Porque até um relógio parado está certo duas vezes por dia
Vou-me aguentando, a esperança é a última a morrer
Neste jogo incerto que o resultado não posso prever
E quando penso em desistir por me sentir infeliz
Oiço uma voz dentro de mim que me diz... Mantém-te firme»

domingo, setembro 23, 2012

A Psicodinâmica do Borderline

 

«Kernberg e col. (Apud. Dal’Pizol, et. al., 2003) descrevem o funcionamento psicodinâmico borderline a partir de três critérios: difusão de identidade; nível de operações defensivas e capacidade de teste de realidade.
A difusão de identidade caracteriza-se como falta de integração do conceito de self e de outros significativos. Ela mostra-se na experiência subjetiva do paciente como sensação de vazio crônico, contradição nas percepções sobre si e em atitudes contraditórias.
Os mecanismos de defesa do ego mais utilizados são as defesas primitivas, centradas no mecanismo de clivagem. Para proteger o ego do conflito, recorrem à idealização primitiva, identificação projetiva, denegação, controle onipotente e desvalorização.
Os portadores TP Borderline mantêm a capacidade de teste de realidade, mas possuem alterações na sua relação com a realidade: a realidade é adequadamente avaliada, mas o comportamento é inapropriado e incoerente com a avaliação da realidade.
Segundo Bergeret (2006) os estados-limítrofes se acham circunscritos economicamente como organizações autônomas e distintas, ao mesmo tempo das neuroses e das psicoses. O autor lembra que Freud ao introduzir o conceito de narcisismo, destacado o papel do Ideal do Ego, feito a descrição da escolha anaclítica de objeto e a descoberta do papel desempenhado pelas frustrações afetivas da criança, reconhece a existência de um tipo libidinal “narcisista” sem um Superego completamente constituído, onde o essencial do conflito pós-edipiano não se situa em uma oposição entre o ego e o superego, uma fragmentação do ego se apresenta como intermediária, justamente entre a fragmentação psicótica e o conflito neurótico. Em seus últimos trabalhos Freud descreve os mecanismos da clivagem e da recusa e faz alusão a um tipo “narcisista” de personalidade.
Nos arranjos-limítrofes o ego em formação consegue ultrapassar o momento em que as frustrações da primeira idade teriam podido operar fixações pré-psicóticas tenazes e desagradáveis, não regredindo a essas fixações. Entretanto no momento em que se dava a evolução edipiana normal esses sujeitos sofreram um trauma psíquico importante. É um trauma afetivo que corresponde a uma “comoção pulsional”, ocorrida em um momento em que o ego ainda está não-organizado e demasiado imaturo no plano do equipamento, da adaptação e das defesas. O Ego imaturo busca então, integrar essa experiência (o trauma psíquico) as outras experiências do momento e interpreta essa percepção como uma frustração e uma ameaça à sua integridade narcísica. Nessas condições o sujeito não terá possibilidades de negociar essa percepção no contexto de uma economia triangular genital, como poderia fazer, um pouco mais tarde e melhor equipada, uma estrutura neurótica. Para essa pessoa será impossível se apoiar no amor por um genitor para suportar sentimentos eventualmente hostis em relação ao outro genitor. Tenderá a não saber usar o recalcamento para eliminar do consciente a tensão sexual ou agressiva, recorrerá a mecanismos mais próximos dos que emprega o psicótico (a recusa, a identificação projetiva, a clivagem das imagos, o manejo onipotente dos objetos, entre outros) (BERGERET, 2006).
Segundo Bergeret (2006) o estado-limítrofe não pode ser considerado uma verdadeira estrutura, pois permanece em uma situação somente “arranjada”, mas não estruturalmente fixada. É um esforço instável e custoso do Ego pra se manter fora das duas grandes estruturas, a linhagem psicótica, a qual no seu desenvolvimento ultrapassou, e a linhagem neurótica, a qual não conseguiu atingir.
Segundo Zimerman (2004) todas as partes inerentes a parte psicótica da personalidade estão presentes, em algum grau e forma, nesses pacientes fronteiriços; mas conservam um juízo crítico e senso de realidade. Segundo o autor a raiz do estado psicótico borderline reside nas faltas e falhas ocorridas durante o desenvolvimento emocional primitivo, com a conseqüente formação de vazios.
Bergeret (2006) localiza o estado-limítrofe como uma doença do narcisismo. O ego não consegue aceder a uma relação de objeto genital, no nível dos conflitos entre Id e Superego. A relação de objeto fica centrada em uma dependência anaclítica do outro. E o limítrofe fica se defendendo contra o perigo imediato da depressão, sofre de uma angústia de perda de objeto e de depressão e centra seus investimentos na relação de dependência em relação ao outro. A relação de objeto é uma relação a dois, onde trata-se de ser amado pelo outro, o forte, o grande, estando ao mesmo tempo separado dele como objeto distinto, mas ao mesmo tempo “apoiando-se contra ele” (anaclitismo).
Zimerman (2004) nomeia-os como portadores de uma “neurose polissintomática”, onde esses pacientes recobrem suas intensas angústias depressivas e paranóides com uma fachada de sintomas ou de traços caracteriológicos, de fobias diversas, manifestações obsessivo-compulsivas, histéricas, narcisistas, somatizadoras, perversas, etc. todas podendo ser concomitantes ou alternantes. Em casos avançados podem aparecer manifestações pré-psicóticas.
Zimerman (2004) destaca que no borderline a presença de sintomas de estranheza (em relação ao meio ambiente exterior) e de despersonalização (estranheza em relação a si próprio) estão intimamente ligados ao fato de que essas pessoas apresentam um transtorno do sentimento de identidade, o qual consiste no fato de que não existe uma integração dos diferentes aspectos de sua personalidade, e essa “não integração” resulta numa dificuldade que esse tipo de paciente tem de transmitir uma imagem integrada, coerente e consistente de si próprio. Zimerman destaca que esse tipo de estado mental decorre do fato de o borderline fazer uso excessivo da defesa da clivagem (dissociação) dos diferentes aspectos de seu psiquismo, que permanecem contraditórios ou em oposição entre si, de modo que ele se organiza como uma pessoa ambígua, instável e compartimentada. Tendem a sentir uma ansiedade difusa e uma sensação de vazio.
Segundo Kernberg (1980, apud. Vieira Junior, 1998) a dificuldade essencial do borderline é manter mesclados aspectos de violência afetiva positiva e negativa de um mesmo objeto ou de si mesmos, da qual tentariam se defender por meio de um mecanismo de splitting. Essa dificuldade de lidar com a ambivalência leva também a extensivo uso de identificações projetivas e idealizações primitivas.
Segundo Pizol, Lima et. al. (2003) as características estruturais secundárias desta organização de personalidade como manifestações de fraqueza egóica, patologias do superego e relações objetais cronicamente caóticas seriam consequências diretas da difusão de identidade e do predomínio de operações defensivas imaturas.

Tratamento terapêutico

As dificuldades enfrentadas pelo paciente borderline são muito amplas, são pessoas severamente disfuncionais; podem psicotizar numa situação de estresse; e no processo terapêutico podem regredir facilmente em resposta à sua falta de estrutura ou interromper as psicoterapias tempestuosa e impulsivamente. É preciso lidar ainda com as ameaças constantes e o risco suicida e possíveis necessidades de internação.
Em relação ao tratamento terapêutico Dal Pizol et. al. (2003) esclarecem que a psicoterapia individual pode proporcionar a exploração intrapsíquica profunda e se, reativadas as relações objetais primitivas, poderá permitir a integração dos aspectos dissociados da personalidade. A terapia de grupo permite a exploração das transferências múltiplas, a resolução das resistências interpessoais, proporciona novos modelos de identificação e apoio ao ego, bem como fornece um “laboratório” para a vivência de novos comportamentos, alem de ajudar a limitar a raiva e administrar a atuação.
A intervenção social constitui-se de uma estratégia essencial no tratamento do paciente Borderline. Segundo Gabbard (1998, apud Dal Pizol et. al.) intervenções familiares podem ser necessárias para que o tratamento tenha sucesso, sendo o primeiro passo para a identificação do papel das interações familiares na patogênese e manutenção da sintomatologia do paciente. É preciso articular a construção de toda uma rede social de apoio ao sujeito.
O borderline não é capaz de suportar grande quantidade de ansiedade. Segundo Vieira Junior (1998) a psicoterapia deve privilegiar uma abordagem mais relacional do que transferencial, mais ativa e expressiva do que passiva e expectante, mais suportiva que geradora de ansiedade.
Romaro (2002) destaca que um dos problemas no manejo terapêutico é a intensa agressão que se expressa na relação transferencial e que exige que o terapeuta possa conter, tolerar e compreender essas reações, sem agir de forma retaliatória e sem sentir sua identidade ameaçada. O impasse é transformar o comportamento destrutivo em uma específica constelação transferencial.
Na abordagem terapêutica é importante o estabelecimento de parâmetros e limites claros que norteiem o tratamento, maior atividade verbal do que geralmente se aplicaria no tratamento de outros pacientes, maior tolerância a comportamentos hostis, desestímulo a atuações e privilégio do aqui e agora em detrimento de análises de reminiscências (Vieira Junior, 1998).
Vieira Junior (1998) diz que a terapia deve buscar aliviar os sintomas angustiantes e propiciar a alteração de alguns padrões de personalidade que se mostram pouco adaptativos. O paciente deve ser levado a ter contato com suas distorções cognitivas e dinâmicas, corrigir deficiências egóicas e fortalecer habilidades sociais e fazê-lo usar a seu favor suas funções egóicas mais estáveis.
Segundo Romaro (2002) o grande desafio é criar um espaço mental onde o pensar possa ocorrer, tornando representável o irrepresentável, pois é a capacidade de representação que propicia a transformação das imagens em palavras dentro do nível da realidade, o que pode ocorrer no processo analítico por meio da introjeção das interpretações. O estabelecimento da aliança terapêutica é algo particularmente difícil, devido à alta probabilidade de ocorrência de acting-out, com manifestações transferenciais e contratransferenciais intensas exigindo que o terapeuta seja ativo, flexível e continente.
As terapias devem auxiliar o sujeito a encontrar formas mais adaptativa para enfrentamento de suas dificuldades e conflitos, ajudar a controlar o acting e os sintomas que causam sofrimentos e conflitos. É preciso considerar a heterogeneidade dos sintomas e as comorbidades. O borderline não é uma categoria homogênea, engloba sinais e sintomas diversos, além de diferentes níveis de adaptação e regressão.»


Fonte: http://artigos.psicologado.com/psicopatologia/transtornos-psiquicos/personalidade-borderline#ixzz27KJIFwuA

quinta-feira, janeiro 19, 2012

Ômega 3 no tratamento da depressão

«A suplementação com Ômega 3 melhora o controlo das emoções e do humor, prevenindo a depressão.
 O Ômega3 presente nos peixes, crustáceos e algas é um nutriente muito importante para as funções cerebrais, pois 60% do cérebro é constituído por gordura sendo que na sua maior parte de ácidos gordos Ômega 3.
  A deficiente ingestão desta gordura está associada a maior perda de memória do idoso, e a elevados níveis de sentimentos de angústia. No tratamento da depressão das crianças e dos adolescentes a toma de Ômega 3 mostrou ter a mesma, se não maior, eficácia terapêutica que os anti depressivos químicos.
  Durante a gravidez, a deficiente ingestão desta gordura está associada a menor QI verbal do filho e a suplementação com Ômega 3 melhora o desenvolvimento neurológico da criança.
   Nos bebês prematuros a sua suplementação melhora as capacidades cognitivas, sua suplementação pode ser recomendada durante a gestação e o aleitamento para suprir as necessidades acrescidas da mãe e do filho.
   Nos doentes com depressão sujeitos a tratamento farmacológico a toma de Ômega 3 (EPA e DHA) melhora o quadro clínico e os efeitos dos medicamentos, reduz a intensidade das manifestações da depressão, ansiedade, perturbações do sono e disfunção sexual, é um tratamento eficaz e muito bem tolerado na depressão.»

Fonte: http://www.tuasaude.com/omega-3-no-tratamento-da-depressao/



segunda-feira, janeiro 16, 2012

Noticia do Translational Psychiatry

«Os Maus tratos na infância, que provocam a modificação epigenética do gene do receptor de glucocorticóide (NR3C1), influenciam o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (eixo HPA). Foi investigado se os maus tratos na infância e sua gravidade estariam associados com aumento da metilação do promotor exon NR3C1 1F, em 101 pessoas com transtorno de personalidade borderline (TPB) e 99 com transtorno depressivo maior (MDD), indivíduos com, respectivamente, uma taxa alta e baixa de maus tratos na infância, e 15 indivíduos MDD comorbidade com transtorno severo pós-traumático (TEPT). O abuso sexual na infância, a sua gravidade eo número de tipo de maus-tratos é positivamente correlacionado com NR3C1 metilação (P = 6,16 × 10-8, 10-7 e 5,18 × 1,25 × 10-9, respectivamente). Na BPD, a repetição de abusos e abuso sexual com penetração estão correlacionados com uma maior porcentagem de metilação. O sangue periférico pode, portanto, servir como um proxy para os efeitos ambientais nos processos epigenéticos. Essas descobertas sugerem que os eventos de vida precoce podem de forma permanente causar impacto no eixo HPA que ocorrendo modificações epigenéticas do NR3C1. Este é um mecanismo pelo qual a maus tratos na infância podem levar para uma vida adulta psicopatológica.»

fonte: http://www.nature.com/tp/journal/v1/n12/full/tp201160a.html

segunda-feira, janeiro 02, 2012

    « Na patologia borderline, predomina a identificação primária. De facto, encontramos fortes alterações da identidade nos pacientes psicóticos e nos estados-limite. Nos primeiros, encontramos uma identidade alienígena, constituída por assimilação do que os outros disseram ao sujeito que ele era, isto é, por identificação imagóico-imagética. Nos pacientes borderline, a identidade é difusa – o indivíduo não tem uma identidade definida, o que acontece porque o indivíduo construiu-se na base da identificação imagóico-imagética e da identificação ao modelo, pouco se interrogando a si mesmo e observando a sua experiência. Neste sentido, a identidade idiomórfica está pouco organizada – o sujeito não se conhece por dentro, por aquilo que sente que é, mas por aquilo que os outros lhe dizem que ele é.

   A ansiedade de separação é muito intensa, já que o paciente borderline liga-se ao outro mais por necessidade do que por afecto.
   A capacidade de funcionar e o prazer no funcionamento estão ausentes no borderline – é um paciente que passa ao acto, não investindo na tarefa, mas apenas na finalidade. Deste modo, são pessoas com pouca capacidade lúdica e pouca capacidade de simbolização (já que esta depende aquela). A baixa tolerância à frustração e o fraco controlo dos impulsos acentua a tendência de passagem, ao acto. Nestes pacientes, o pensamento é um esforço e não um prazer.

Etiopatogenia da patologia borderline
   Segundo A. Coimbra de Matos, a etiopatogenia da patologia borderline centra-se na estimulação e resposta inadequadas, isto é, rejeitantes, de engolfamento, desnarcisantes e acusadores, actuando antes e sobretudo durante a sub-fase de reaproximação no processo de separação-individuação e em reaproximações ulteriores (fase genital infantil, período de latência ou em plena adolescência). Este tipo de relação objectal terá como consequência o acentuar do universal conflito de ambitendência e o agravamento do conflito em torno da agressividade, aumentada e dificilmente integrada na personalidade. Assim, dada a imaturidade do ego e a sobrecarga emocional a que o sujeito é exposto, s mecanismos de defesa predominantemente utilizados serão processos primitivos ou arcaicos:

•clivagem afectiva binária (bipartição do objecto em bom e mau) – processo activo de defesa contra a ambivalência extrema e insuportável (na psicose, a clivagem não é apenas afectiva, mas também geográfica – formando objectos parciais – e múltipla, o que leva à fragmentação do objecto e do self, sendo também tendencialmente passiva, ou seja, não exigindo um esforço activo da parte do indivíduo, é mais um desmoronamento por falta de coesão – desmantelamento do eu)

•projecção identificativa (projecção do mau para fora da relação privilegiada sobre um terceiro)

•denegação da realidade

•reforço da dependência com idealização objectal primária (idealização extrema e acrítica)

•erosão narcísica e da auto-imagem (diluição da identidade e ameaça de fragmentação do self)

As defesas neuróticas podem emprestar ao quadro clínico um colorido neurótico; por vezes, encontramos também defesas depressivas pela introjecção da malignidade do objecto; mais frequente é o recurso à posição maníaca – o sujeito agarra-se a satisfações pontuais, negando a realidade interior de insatisfação afectiva, abandono, desamparo e agressão.
   A defesa maníaca, ao negar a depressão por perda/carência de afecto, trava a evolução para a posição depressiva e impede a reconciliação com o objecto, bem como o estabelecimento de uma relação minimamente satisfatória. Pelo controlo agressivo e omnipotente do objecto, impede o investimento da representação objectal – o triunfo é, então, ilusório e, consequentemente, a satisfação e precária e diminuta, daí o recurso a gratificações episódicas.
   Nos pacientes borderline, o mundo interior é invadido pelo mau, que domina o bom; eclode, então, a raiva e o sentimento de vazio. Em face de tamanha ambivalência, insuportável pelo sofrimento que provoca, a clivagem impõe-se. Com a clivagem, instala-se a típica relação alternante da personalidade limite – efusão passional seguida de ataque raivoso. E as ondas positivas e negativas sucedem-se – com interregnos de apatia (anulação afectiva, aborrecimento) e redução do investimento na realidade externa – depressão limite – ou de hiperactividade maniforme ou ansiosa (busca de estímulos, passagem ao acto, irrequietude) – hipomania.
   A instabilidade do humor, das relações, da intencionalidade e dos próprios processos defensivos complementares será o denominador comum dos variados quadros clínicos que a perturbação nuclear vai apresentar. Por outro lado, encontramos difusão da identidade e indecisão ou alternância na orientação libidinal, logo, ambiguidade na identidade sexual.
   Este síndrome, em qualquer idade que se apresente, traduz um conflito intrapsíquico não resolvido à volta da separação do objecto primário, isto é, a dolorosa fixação do paciente num estado de certa simbiose/dependência com a figura materna e/ou dos seus substitutos, extensões geográficas ou representantes simbólicos. A frequência com que encontramos nestes pacientes uma mãe, ou um pais (ou ambos) com características simbiônticas – desejando e vivendo predominantemente em simbiose – é enorme, o que nos leva a considerar a importância etiológica da personalidade borderline do objecto materno.
   É precisamente a necessidade que alguns pais têm de que os filhos preencham as suas lacunas narcísicas, rejeitando-os quando assim não acontece, que pode fabricar um caso-limite. Neste sentido, a simbiose da qual o paciente tem dificuldade em sair não é só produto de um período simbiótico infantil insuficiente ou insuficientemente vivido – por carência sistemática, abandonos drásticos e frequentes – mas também da traça simbiôntica do objecto parental, o que impede o desprendimento evolutivo e favorece o laço simbiótico.
   São mães e pais que gratificam a simbiose-dependência e atacam os desejos, impulsos ou comportamentos autónomos da criança, isto é, toda a sua exploração e autonomia é sistematicamente reprovada, reprimida e diminuída, ao mesmo tempo que é estimulado, valorizado e premiado o comportamento de aproximação e de apego. Logo, o percurso evolutivo é travado e distorcido por um predomínio do sistema de apego sobre o sistema de exploração.
   É uma verdadeira cultura de colonização dos filhos – o filho é uma espécie de prótese ou adorno dos pais e só é valorizado enquanto tal, quando e como desempenha essa função. Frequentemente, à excessiva simbiose com a mãe, soma-se a carência paterna, por ausência ou indisponibilidade afectiva; o que reforça ainda mais a simbiose.
   Uma outra característica destes pacientes é o ressentimento, que depende da vulnerabilidade narcísica. O ressentimento é indomável, violento e duradouro, provocando desejo de vingança, retracção e ruptura relacional – a ruptura por ressentimento, tendencialmente definitiva, duradoura e dissolvente da relação objectal.
   Assim, a representação do objecto apaga-se, quase desaparece, e daí o vazio, a desertificação do mundo interior, o esbatimento ou semi-perda do objecto interno. A constância afectiva do objecto (permanência no mundo interno) é atingida – donde, a dificuldade em evocá-lo na sua ausência, principalmente, de recordá-lo de um modo vivo, animado e relacional, revivendo saudosamente o passado e construindo uma fantasia de agradável reencontro, um romance interior. No paciente limite, a recordação existe, mas é pungente e dolorosa e a sua depressão – a depressão limite – aproxima-se da depressão psicótica, do buraco depressivo.
   O mecanismo típico da personalidade borderline é a clivagem afectiva do objecto, que perde, assim, a sua continuidade afectiva como defesa contra a insuportável ambivalência, o intolerável vivido de sentir-se rejeitado pelo objecto. Pela clivagem, instala-se a alternância da relação boa e má, ou seja, relação de objecto aceite porque aceitante e rejeitado porque rejeitante.
   A consequência é a clivagem do self – bom self, identificado com o bom objecto, e mau self, identificado com o mau objecto. Esta relação clivada e alternante é a característica dinâmica mais típica da personalidade borderline, que acentua e torna perene a sua conhecida instabilidade.
   Ao nível da consciência psicológica borderline, em que a percepção/representação do próprio está ligada à percepção/representação do objecto, a perda deste é seguida de perda no self. Verifica-se, então, por curta que a vivência de falta seja, uma angústia de morte – este vazio ou desaparecimento do essencial traduz a experiência borderline primária, que pela vida fora se repetirá, por evocação emocional reflexa, sempre que algo de semelhante seja vivido na realidade actual.



Psicopatologia
   O paciente limite, ao invés do psicótico, mantém o investimento no mundo exterior – a decepção com alguém ou o desprazer com uma situação leva-o à ruptura do laço afectivo e ao desinvestimento da realidade circunstancial, porém, é uma retirada limitada à pessoa ou situação frustrante. Trata-se, em regra, de um desinvestimento maciço do objecto, mas só do objecto em causa, com apagamento da sua representação.
   A difusão da identidade, característica importante destes pacientes, tem aqui, nesta dificuldade de persistir nos investimentos, uma das suas mais importantes raízes. Assim, a fim de limitar o sofrimento e a decepção, em face de circunstâncias desagradáveis ou mesmo insuportáveis, o paciente limite retira-se e desinveste, investindo noutros objectos.
   Assim, após ruptura amorosa, a face negativa do objecto eclipsa o bom objecto; de qualquer forma, o sujeito retoma o investimento – se não do mesmo, de outro objecto; se não libidinalmente, agressivamente. É uma eleição narcísica – o sujeito reflecte-se no espelhado do objecto ou aquece-se ao seu brilho e participa na sua grandiosidade; ou ainda porque o objecto o representa, é um duplo narcísico – a sua imagem especular. Neste último caso, quando o tempo e a realidade lhe mostra as diferenças, irrita-se, decepciona-se e abandona. É, aqui, uma escolha por projecção do eu ideal.
   A sua vida é pontuada de grandes estusiasmos/amores ardentes, cedo abandonados, porque rapidamente frustrantes, pela não correspondência o ideal desejado. Muito desejado, porque nunca obtido, não fora essa a sua falta básica – a de um amor materno/paterno de qualidade indiscutível, um afecto incondicional.
   Em face do comportamento parental de exigência e sucção, a criança ou se deprime e culpabiliza ou se torna um revoltado agressivo e disfórico; a insuficiência narcísica com defesa pela retracção, arrogância e supercompensação configurando o quadro da personalidade narcísica ou o desenvolvimento de uma personalidade anti-social são também saídas possíveis.
   Outro aspecto significativo do funcionamento limite é a existência de uma certa confusão entre percepção e fantasia, realidade exterior e realidade interna. A intensidade do afecto que impregna as fantasias do paciente limite é tal que facilmente elas adquirem o cunho de realidade. Complementarmente, a violência emocional com que as percepções ressoam é frequentemente tão grande que, com facilidade, estas são de tal maneira distorcidas que já pouco têm que ver com o real observado.
   O paciente limite recorre abundantemente à identificação projectiva. Tendo atingido o nível da tridimensionalidade – com o reconhecimento do mundo/espaço interno do objecto e desenvolvimento do seu próprio mundo interno -, mas não tendo conseguido ainda uma suficiente estabilidade, coesão, domínio e aceitação do seus conteúdos internos, é-lhe fácil desembaraçar-se daquilo que o incomoda ou causa problemas projectando-o no outro. Esses conteúdos, reconhecidos então como alheios, deixam de perturbar o self e são mais bem controlados. É uma evacuação agressiva, que dá às relações um cariz paranóide, mas alivia a tensão e o conflito intrapsíquicos. É, por outro lado, debilitante, porque produz um certo esvaziamento do self.
   Mais frequentemente, o borderline projecta no objecto externo actual ou em pessoas circunstanciais atributos do objecto interno arcaico. Esta projecção identificativa tem por principal finalidade conservar a boa relação com o objecto eleito, desembaraçando este dos seus defeitos mais desagradáveis. É uma projecção para fora da relação privilegiada, que se quer defender e preservar da toxicidade.
   A angústia de separação, a depressão de abandono, o sentimento de solidão e desamparo (falta e inacessibilidade do objecto) e de vazio interior (não consolidação do introjecto objectal orbitário) traduzem em linguagem semiológica o desconforto e mal-estar, a aflição, a tristeza e o desespero específicos destes pacientes. Verdadeiramente só e vazio, porque sem representação evocável do objecto anaclítico, a segurança interior do paciente borderline assenta fundamentalmente no objecto externo.



Tratamento
A patologia borderline é a patologia da insegurança, da perda objectal precoce e da ferida narcísica profunda, o que impõe uma reconstrução analítica que permita a emergência dos afectos perdidos, uma construção da transferência que facilite a restauração do self e uma capacidade de sonho e autorização de liberdade no analista capazes de promover a eclosão do funcionamento mental criador do analisando.


O tratamento psicológico da perturbação borderline visa:


•compreensão, análise e resolução transfero-contratransferencial da depressão de desamparo

•restauração da falha narcísica através da transferência simbiótica, que permite uma contínua, consistente e não traumática progressão para a separação, individuação e autonomia

•diferenciação, confirmação da identidade própria e afirmação de intenção e desejo

O tratamento da clivagem pela interpretação sistemática da transferência negativa no aqui e agora do vivido da sessão – a insuportável ambivalência que a determinava vai-se temperando pela experiência de não retaliação nem abandono ou desprezo e pela simultânea constatação da permanência do bem-estar e contentamento do objecto analítico